Desmistificando o termo “vesting”
Por Julio Cardozo
Vivemos um momento propício para as startups. Grandes empresas conhecidas por todos nós surgiram de uma ideia disruptiva, com uma aposta e investimento. Agora, imagine começar um negócio com um sócio. Ambos contribuem com tempo e energia para que o projeto evolua. Mas depois de um período, seu parceiro abandona a ideia, e você continua trabalhando firme, pois acredita nela, até que finalmente a empresa deslancha, com altas chances de ganhos.
Ao ver que o sucesso da empreitada, o antigo sócio entra em contato, pedindo por 50% dos lucros da empresa, visto que a sociedade tinha a divisão baseada em 50-50 no momento da fundação. Para evitar esse tipo de situação, o ideal é decidir “o fim no começo”, pois é o momento em que todas as intenções estão alinhadas e as chances para desentendimentos são menores.
Para garantir que a participação de fundadores e funcionários nas ações da empresa seja compatível com o envolvimento real de cada um no seu crescimento e sucesso, há um instrumento contratual bastante simples, apesar de pouco conhecido no Brasil: o vesting.
Neste instrumento, ficam definidas as condições da participação de cada um na startup, garantindo que um sócio, funcionário ou conselheiro que deixou o negócio muito cedo não leve uma fatia maior de lucros do que lhe é merecido. O vesting permite, portanto, que receba sua participação de maneira progressiva, de acordo com o tempo de contribuição.
Também é possível acelerar o vesting, ou seja, antecipar o processo de pagamento das parcelas de ações para antes do prazo previsto em contrato.
As empresas que podem utilizar-se do vesting são aquelas concebidas na forma de Sociedade Anônima (S/A). Aconselha-se que o acordo seja feito com base no Artigo 111, da Lei nº 6.404, de 15 de dezembro de 1976, que diz: “O estatuto poderá deixar de conferir às ações preferenciais algum ou alguns dos direitos reconhecidos às ações ordinárias, inclusive o de voto, ou conferi-lo com restrições, observado o disposto no artigo 109”.
Em contrapartida, as empresas na forma de Sociedades Limitadas (Ltda.), são impedidas pelo Código Civil, de acordo com o Artigo 1.055, inciso 2º, de ter capital social na forma de prestação de serviços.
Cláusula Cliff
Os contratos vesting podem ser complementados por uma Cláusula Cliff, que coloca um tempo mínimo de colaboração, em geral de um ano, para que o direito à cota de ações da startup tenha validade. Ou seja, se o funcionário, por exemplo, a quem foi prometida uma participação na empresa sair antes de cumprir essa carência, ele abre mão do seu direito a uma parcela na sociedade.
Supondo que um novo sócio surja e que a ele seja destinado uma fatia de 10% das ações para um vesting de quatro anos, a cada ano o sócio receberá o proporcional ao seu contrato, ou seja 2,5% de participação. O Cliff é, portanto, utilizado para proteger a empresa de funcionários improdutivos ou que desejem sair do projeto antes do período estipulado em contrato.
Em suma, o contrato de vesting e Cláusula Cliff são ideais para proteger as empresas de problemas futuros e assegurar divisão de capital de forma justa para todos os envolvidos.
* Julio Cardozo é diretor executivo de Riscos no Banco Cooperativo Sicredi.